Já sabemos que a vingança é o motor
de muitos filmes de ação feitos em Hollywood. Mas quando quem quer vingança,
não é um humano, mas um animal, fica meio estranho, pois como o próprio caçador  (Martin) diz: Leões não fazem essas coisas. Entretanto, lembrei na hora do filme “A
Sombra e a Escuridão” de Stephen Hopkins de 1996 que conta a história verídica
de dois leões que mataram 135 pessoas em 1898 no Quênia.



A Fera do título é um leão, cuja alcateia
inteira foi exterminada por caçadores furtivos. E quem terá a infelicidade de
conhecê-lo, são Nate Samuels (Idris Elba) e suas filhas Norah (Leah Jeffries) e
Meredith (Iyana Halley). Os três chegam àquela região da selva africana após a
morte da ex-mulher e da mãe das garotas, respectivamente, para que as meninas
conheçam a aldeia original da mãe, mas durante um passeio pela Savana, guiado por
seu melhor amigo e defensor dos animais Martin (Sharlto Copley), o grupo acaba
por descobrir uma situação pra lá de aterrorizante: um velho leão altamente agressivo
que está matando pessoas por vingança, uma vez que os caçadores acabaram com a
família dele.



O filme em si se vende com a promessa
de Idris Elba enfrentando um leão, mas 'A Fera' é muito mais do que isso.
Cuidado, com isso não quer dizer que seja um filme essencial, mas é um trabalho
ágil e contundente que sabe se complicar o suficiente para oferecer uma
experiência intensa ao espectador. Aliás, por várias vezes senti aquela
angústia típica quando o protagonista se arrisca mesmo sabendo que pode ser
devorado vivo pela fera. A atuação de Elba, como sempre, consegue dar
credibilidade ao filme. Afinal, Idris tem carisma de sobra e muita qualidade em
seus trabalhos.



O trabalho dos atores - dificilmente
há 4 personagens humanos com peso real na história - ajuda que isso nunca se
torne pesado, mas também a fluidez visual do filme, muitas vezes recorrendo a
planos longos para melhor nos mergulhar na história. Esta é uma tendência que
se mantém constante até praticamente o momento em que a família protagonista
fica pouco menos à mercê do leão. O lado meio digamos assim… cansativo do
roteiro é a crise familiar que teima em aparecer mesmo tendo um leão assassino
do lado de fora do carro.



Além disso, Baltasar Kormákur
('Everest') faz uso desta solução técnica evitando qualquer tipo de virtuosismo
desnecessário, mas sim como um mecanismo primeiro para dar maior agilidade ao
filme e depois para transmitir de forma muito eficaz ao espectador a incerteza
em torno daquilo que seus personagens principais estão passando.



A isso devemos acrescentar que o
filme não recria mais do que o necessário ao já citado drama familiar e deixa a
história seguir naturalmente, deixando-nos alguns detalhes ao longo do caminho
que serão essenciais mais tarde. Desta forma, resolve-se satisfatoriamente um
primeiro ato que em outras mãos poderia ter sido uma introdução necessária, mas
pesada.



No entanto, é mais tarde quando 'A Fera’
realmente decola, tornando-se totalmente aquele thriller de sobrevivência com
toques de terror que prometiam desde o início. Aí é verdade que é preciso um
importante trabalho de suspensão da descrença para acreditar que esse leão se
tornou uma fera nunca antes vista, mas o filme está correto ao vincular isso ao
fato de que o orgulho de um leão é sua família, assim surgindo um pequeno
paralelismo com os protagonistas. Cuidado, isso nunca é algo que é explorado em
profundidade, mas pelo menos dá alguma base para o animal se tornar pouco menos
que uma máquina imparável, mas em troca também não acaba sendo um monstro
digital inacreditável.



A partir daí a tensão aumenta e o
roteiro não comete o erro de cair em bobagens inacreditáveis. Tudo o que
acontece se encaixa na combinação da adrenalina do momento e da necessidade
urgente de proteger seus entes queridos, conseguindo assim aquele toque
emocional que dá mais entidade ao todo. Aí o trabalho físico de Elba se destaca
acima de tudo, mas sempre lembrando que ele é médico e não tem nenhum tipo de
treinamento para enfrentar uma ameaça dessa natureza.



Obviamente, o clímax do filme vem com
o inevitável confronto final, apesar de ter a sensação de que o leão está na
verdade “brincando” com sua presa (Nate), já que matou os outros com tanta
rapidez e ferocidade. A cena lembra um pouco aquela famosa cena de “O Regresso”
onde o urso ataca DiCaprio. É a maneira de consertar tudo que agora faz
sentido. É certo que toda essa fase de perseguição ao leão não oferece nada
particularmente diferente de contos semelhantes, mas é convincente, faz bom uso
do suspense e faz você se importar com seus personagens humanos.



'A Fera' pode não propor nada de
novo, mas oferece uma história de sobrevivência selvagem e convincente que não
vai muito longe. Além disso, boas doses de tensão e trabalho eficaz para que a
parte da apresentação dos personagens fuja dos problemas habituais. Eu
recomendo!

  1. FICHA TÉCNICA
  • Título original: Beast
  • 11 de agosto de 2022 No cinema / 1h 33min / Suspense, Ação, Drama
  • Direção: Baltasar Kormákur
  • Roteiro Ryan Engle, Jaime Primak Sullivan
  • Elenco: Idris Elba, Sharlto Copley, Iyana Halley

















Professor de Inglês e também crítico de cinema. Fã de carteirinha de filmes de ficção, ação e aventura, mas sempre com o olhar diferenciado para cada gênero de modo a transmitir com máxima fidelidade a minha impressão real sobre cada filme. Apesar do estrangeirismo do nome sou 100% cearense.